este site é um trabalho em curso, é um exercício. estou a fazer este remodelação ao vivo e a cores.

olá vasco

no dia vinte e cinco de setembro de dois mil e dezanove nasceu o ser humano mais extraordinário de sempre. até ver.

nasceu mais cedo do que o previsto, mas não por vontade própria. trinta e sete semanas.

eram dezassete e vinte.

25 de setembro de 2019

e pouco depois largavam-me nas mãos um pequeno velhote com acne.

neonatologia durante uma semana. incubadora e solário, berço. e cadeiras de escritório. dilatação nos rins, consultas marcadas e o resto que virá, que virá.

os sonos, para já, em dia. vamos ver amanhã.

agora em casa. agora somos sete.

42.195

em dois mil e doze mudámo-nos para o campo de santa clara. a margem do rio, ali à beira, era o sítio perfeito para correr. e as primeiras corridas foram boas.

um dia, depois de fazer pouco mais de quinhentos metros, começou a doer-me o joelho direito. parecia que estava inchado, mas só por dentro, não o conseguia dobrar.

foi assim durante meses, um ano ou quase dois. a andar não doía, de bicicleta também não, a jogar à bola (que envolve bastante corrida e mudanças bruscas) não doía e a fazer yôga era igual.

seguiram-se meses de consultas e exames, todos limpos — só faltou uma TAC. por dentro tenho dos joelhos mais bonitos do mundo. era da forma como colocava os pés, disse o médico.

e entretanto mudámos de casa.

comprei uns ténis novos e fui desafiado para uma corrida de dez quilómetros. recomecei a correr. e fui forçando, fazendo distâncias maiores, com um joelho elástico e sempre com dores. mas das cinco, nove: ou isto partia e íamos perceber de onde vinha o problema ou as dores passavam.

e passaram. mais ou menos. mais ou menos, sim.

catorze de outubro de dois mil e dezoito

no dia seis de maio de dois mil e dezoito comecei a treinar para a maratona.

tinha já feito algumas distâncias longas e algumas meias-maratonas, sem surpresas, com resultados medianos. os treinos longos preocupavam-me — não por serem longos, propriamente dito, mas porque a vontade de os fazer podia falhar.

falhou pouco. treinei durante vinte e duas semanas, seiscentos e vinte e oito quilómetros. achava que estava preparado, no entanto, a pensar que devia ter feito mais um treino longo, acima dos trinta, era esse treino que ia fazer toda a diferença.

no dia treze acordei com uma cãibra no gémeo direito. foi a segunda este ano (e na vida). da primeira vez até saltos dei na cama agarrado à perna — não o suficiente para acordar mais ninguém naquele quarto, aparentemente. levantei-me, coxeei um pouco até à casa de banho, passou e não deu mais problemas.

a prova estava marcada para as oito da manhã, mas, por causa do mau tempo no dia anterior, foi adiada para as nove. uma hora de diferença que de pouco serviu, excepto para dormir um pouco mais e atrasar-me o almoço.

o dia. levantei-me às seis, tomei o pequeno-almoço e fiz uma caminhada nas glamorosas ruas de alfragide. às sete estava a caminho e um pouco antes das oito no local da partida, em cascais.

escassas quatro horas e vinte e três minutos depois entrava triunfante no terreiro do paço.

comecei bem. consegui ir sempre dois ou três segundos abaixo do ritmo médio que tinha planeado e sentia-me bem. até ao quilómetro dezassete. começou a doer-me o gémeo direito, no exacto sítio da cãibra — e tanto que ainda faltava. comecei a abrandar o ritmo, quando tentava acelerar o passo a dor voltava e o ritmo foi abrandando. foi desmotivante

não foi uma corrida a sofrer, nem parecido. era ter vontade de ir mais rápido e saber que conseguia ir mais rápido se não fosse aquele ponto muito específico do gémeo a travar. ver a ponte vinte e cinco de abril, em algumas zonas do percurso e por uns momentos pensar: é já ali. mas não só o já ali era ainda muito longe, como, em chegando à ponte, ainda faltariam cinco quilómetros. e aquele ponto muito específico do gémeo a travar.

já em lisboa ainda parei duas vezes para alongar tranquilamente. o mal já estava feito.

o último quilómetro passou num sopro.

percurso da maratona de lisboa 2018. começou em cascais e acabou no terreiro do paço.
4H23M41

to télos

a distância, os números da distância, incomodam-me. não há motivo para não ser um número inteiro e redondo. a lenda em que se basearam para a criação desta prova é, como diziam os antigos, uma boa lenda e não havia necessidade de terem ficado com estes números apenas porque foi assim nuns jogos olímpicos.

de qualquer forma, esta é a distância que temos, a que tem gravitas, esta é a prova. e a verdade é que fui sentindo isso em alguns momentos da corrida — estava a correr uma maratona. especialmente, sem grande surpresa, ao passar no pórtico de partida e na entrada no terreiro do paço, antes de contornar e passar o arco da rua augusta — estava a terminar uma maratona.

nos primeiros dez minutos da manhã seguinte as minhas pernas não queriam andar.

olá tomé

um cão deitado num sofá
tomé, o coxo.

o tomé foi achado a coxear no IC2.

este também ninguém o quis e em vez de ir para o canil veio cá para casa. ainda mal recuperados.

gosta de andar em duas patas e dorme de barriga para cima. no sofá faz tudo para se se encostar ou deitar no colo. ainda coxeia.

a pesar tanto como um dos gatos lá de casa, fomos buscá-lo no dia quatro de maio.

voltamos assim a ser seis.

camila

foi encontrada à beira da estrada em más condições, no dia catorze de fevereiro. isso não é o mais importante da história.

teria oito anos. gostava de festas na barriga e não tinha vergonha de as pedir ora virando-se rapidamente de barriga para cima, ora delicadamente com a pata. era a definição de meiga.

foi muito forte, tendo em conta… tudo.

as marradinhas no veterinário para irmos embora. e a cauda a abanar. a primeira e última noite, a primeira e última manhã deitados no sofá.

no dia onze de março de manhã, mesmo debilitada, foi três vezes à rua apanhar sol — como que a despedir-se, a sacana. à tarde, rodeada por quem a queria, morreu.

foi demasiado curta esta visita, que tenha valido a pena. valeu, de certeza, pelas poucas semanas em que fomos seis.

06/03/2018

corrida imperial

há uns anos, talvez dois, corremos na corrida de santo antónio em lisboa. foi à noite — e é bom correr nas ruas de lisboa à noite —, com partida e chegada no rossio. no final davam uma cerveja.

ao curvar no terreiro do paço em direcção à rua da prata, já perto do final, parecia que corria sozinho (provavelmente um delírio do esforço), acompanhado apenas pelo meu tempo miserável. nesse momento, junto à estátua, uma pequena orquestra começa a tocar a marcha imperial.

em todo o caso, o star wars: os últimos jedi é um bom filme.

indy

na primeira noite que ficou connosco arrancou a grelha do rodapé dos armários da cozinha e escondeu-se lá debaixo. de manhã tivemos de desmontar o rodapé todo e colar a grelha com fita-cola. no final da semana seguinte deitou-se pela primeira vez ao meu lado, a ronronar.

gostava de queijo da ilha.

não gostava da varanda do sétimo andar. mas passava horas deitado no parapeito da janela da sala. no corredor, faziam a curva pela parede.

foi giro vê-lo passar de gato que vomitava com nervoso miudinho, que se assustava — aqueles fantásticos pulos de mola — com a própria sombra ou uma brisa fresca, por um que parecia gostar do barulho dos camiões do lixo em lisboa. que passeava pelo quintal da última casa, saltava o muro e andava na estrada, quase a fazer jus ao nome que lhe deram.

horas passadas, de madrugada, a raspar na caixa.

dormia à sombra da roseira quando o calor apertava. ou dentro do carro. ou na casota que estava junto ao muro.

companheiro de noites de trabalho, ao colo, ou deitado na mochila ou num casaco em cima da secretária. a maior parte das vezes teimosamente encostado ao braço e ao computador.

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15/04/2017

não perdia uma oportunidade — estava lá em menos de nada — para se alapar no colo. boas noites de sofá e televisão. mesmo quando estava frio e os pés enregelavam.

explorador nato de sacos e ocupa extraordinário de caixas vazias. coisas que já não se fazem.

merda dos rins.

dia dezassete de abril, depois de almoço, no veterinário, morreu.

olá ramiro

um gato preto
o ramiro

apareceu no quintal do vizinho como muitos aparecem; pequenito e miar. deixámos comida do nosso lado à espera que comesse e fosse à vida dele, como é costume irem. mas não conseguia trepar a rede.

sem um olho, a não ver bem do outro e com uma ferida no lombo, recolhemo-lo. ficou por casa à espera de alguém, mas ninguém o quis.

assim, dia vinte e sete, ramiro, o zarolho, tornou-se oficialmente nosso. e somos seis.